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Hoje isto não é sobre mim. É sobre ti.

Estamos cada vez mais focados em nós próprios. O mundo faz-nos crer que tudo gira à nossa volta e nós acreditamos porque parece que este é mesmo o nosso novo modus vivendi. São os nomes das marcas, são os conceitos e são os slogans. É sempre tudo sobre nós. YOUtube, SELFie, Power to YOU. É o serviço de transporte alternativo ao táxi que nos pede que descrevamos numa app qual a música que queremos ouvir, qual a temperatura que esperamos ter, se queremos que nos abram a porta no inicio ou no fim da viagem, entre mil outros aspectos para podermos condicionar o condutor a ser um robot personalizado a nós para nos agradar e podermos depois avalia-lo de 0 a 5, conforme a NOSSA opinião. E nós personalizamos. Personalizamos tudo porque vivemos neste ímpeto de fazer o mundo gerir à nossa volta. Personalizamos tudo porque, também, tudo tem que nos satisfazer. A nós.

O Eu é provavelmente a palavra mais usada e pensada. Compramos óculos desenhados por nós. Personalizamos os nossos ténis, os nossos telemóveis e computadores, os nossos perfis nas redes sociais, o fundo do nosso chat. Tiramos as nossas selfies e a informação chega-nos construída e adaptada em torno das nossas preferências mas ficamos muito surpreendidos quando os resultados de eleições e referendos não são aquilo que a nossa bolha dizia! Chamamos-lhe evolução porque tudo se adapta e molda “magicamente” aquilo que somos, aquilo que gostamos ou aquilo que definimos como sendo o que somos. Vivemos numa escravidão utópica do nosso próprio Eu, onde, na realidade, aquilo que mais fazemos é esquecermo-nos de nos encontrar e de perceber o que somos. Construímos um “suposto” eu que não nos dá grande trabalho e que tem mais a ver com aquilo que gostávamos que os outros achassem de nós do que propriamente com aquilo que somos na verdade. Não nos perguntamos quem somos, não nos damos espaço para perceber. Tomamos estas decisões de personalização baseadas em gostos e preferências escolhidas de uma sequência de opções. Somos tão mais!

No entanto, hoje este texto não é sobre nós, embora pudesse ser porque esta vivência utópica é prejudicial para cada um de nós. Mas hoje o nosso exercício é pensar no outro.

Neste novo paradigma do eu esquecemo-nos sempre do outro. É-nos dito e repetido que tudo é sobre nós, que o nosso compromisso é connosco, com a nossa busca por sermos felizes – ainda que de um modo deturpado – que nunca temos espaço para os outros. Achamos que o outro é uma perda de tempo. Que o outro está ele próprio dedicado a si e que não precisa de nós nem de ninguém. Mas precisa. E não de uma forma instrumental que responda às nossas necessidades, preferências e gostos.

Nós não temos apenas responsabilidade sobre nós mesmos. Nós temos responsabilidade sobre todas as pessoas que fazem parte dos nossos dias. E não é sempre necessário que nos peçam ajuda directamente, que nos acenem com uma bandeira branca, que gritem ou que decidam não sair da cama num quarto escuro por dias e dias a fio. A nossa maior responsabilidade é ser atentos e disponíveis. É sairmos desse estranho conforto do eu e se for preciso tomar atitudes que inicialmente podem zangar e revoltar quem nos rodeia para os ajudar. Não importa que possam reagir de forma errada, importa o resultado final. E o resultado final é sobre eles. Não sobre nós.

A maior prova de que somos humanos e do valor da nossa essência é a nossa capacidade de dar, de sentir o que os outros sentem. Nos filmes de ficção científica muitas vezes temos super poderes como voar, teletransportar-nos ou sermos invisíveis. Na vida real todos nós temos um super poder de que nos esquecemos com frequência: chama-se empatia e é de facto um dom. É uma dádiva que nos permite sentir em nós o que os outros sentem e que nos deve impelir a agir não baseado em nós mas neles. Isto não é sobre nós – sobre nós já temos uma sociedade inteira a agir – isto é sobre o outro. Sobre olhar à volta, perceber nas entrelinhas invisíveis de quem nos rodeia se precisam da nossa mão, dos nossos gestos, das nossas atitudes e tê-las. Independentemente se nos vão perceber ou recriminar inicialmente. Quando, num parto, o médico dá uma palpada no bebé recém-nascido ele chora. Chora revoltado e provavelmente, dentro da sua consciência, não percebe o porquê. Na verdade o médico está apenas a fazê-lo respirar, a dar-lhe uma oportunidade de existir...

Vamos sair da nossa bolha. Olhar um bocadinho à volta para as pessoas que mais gostamos. Perceber e ler as necessidades delas e dar-lhes a mão. Se todos fizermos um bocadinho isto tudo pode ser tão melhor...

Vamos começar já hoje a fazer diferente?

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